opinião

Minuto de silêncio pelo Caixeiral que agoniza em pleno Carnaval

Os da minha idade haverão de lembrar o famoso Trio Irakitan cantando a marchinha "Caixinha de Bom Parecer" em uma cena do filme "Entrei de Gaiato" (direção do J.B.Tanko), que fez muito sucesso no Carnaval de 1959.

Eu tinha 17 anos e vi esse filme.

 Cantei essa música nos lindos bailes do Clube Caixeiral, Santa Maria, RS. Não existia cocaína. Crack. Maconha. No máximo, uma bebedeira ou outra.

 Ninguém morria em acidente de carro. Tampouco se usava arma. A única intenção real era brincar. Namorar. Dezenas de casamentos começaram com namoros no Carnaval de salão. Inclusive, o meu.

 Nascido e criado nos barrancos da Silva Jardim, a poucos metros do Arroio Cadena, hoje escondido embaixo do Parque Itaimbé, convivi desde criança com os festejos carnavalescos. Na Rua Dutra Villa, na década de 50, morava meu querido amigo Marino Xavier, o popular "Tomate", funcionário da Panificadora da Subsistência Militar e árbitro de futebol.

 No pátio de sua casa eram realizados os ensaios do célebre bloco de carnaval "Bota que eu bebo", do qual muito bem lembro o Catixa, massagista do Internacional, de Santa Maria, empunhando o estandarte de lantejoulas pretas e brancas. Este bloco seria o embrião do que viria a ser, décadas depois, a Escola de Samba Unidos do Itaimbé. Eu assisti todos os ensaios deste bloco desde que me conheço por gente. Os vizinhos colaboravam com frios e cada um levava sua própria bebida.

 Já mais adiante comecei a frequentar as reuniões dançantes carnavalescas dos clubes Santamariense e Caixeiral, que começavam às 15h e terminavam às 19h. Santa Maria tinha um pujante carnaval de salão com dezenas de bailes em cerca de 20 clubes em todos os quadrantes da cidade. Guardo com carinho as fotos desta época, com carapuça na cabeça, inocentes rolos de serpentina e sacos de confete nas mãos. Tudo comprado com dinheiro suado economizado das mesadas.

 Já adulto, casado, muito participei com meus pais e amigos da fundação e das promoções da Escola de Samba "Unidos do Itaimbé", pois meu pai foi da diretoria por anos a fio. Lembro dos churrascos, risotos, mocotós, rifas, desfiles, festas, bailes, livros de ouro, mensalidades de associados, doações pedidas na iniciativa privada e demais iniciativas promovidas pelos membros da escola para arrecadar fundos para os desfiles. Lembro de muitos deles: Luizinho e Zaira de Grandi, Alfeu e Iria Pizarro, Luiz Carlos e Iara Druzian, Paivinha, etc...

 Dezenas de artigos escrevi sobre temas carnavalescos para a imprensa nos últimos 50 anos. Por dois anos fui jurado do quesito "Samba-enredo" dos desfiles de Carnaval de Santa Maria. Portanto, ninguém pode duvidar que eu não goste das folias de Momo.

 Nos 10 anos em que morei em Florianópolis não deixei de acompanhar nunca os desfiles na passarela "Negu Kiridu", assim como acompanho todo santo ano os desfiles do RJ pela TV, pois acho o mais belo espetáculo artístico-musical do Planeta.

 Na minha velhice, vejo com tristeza que mais de 95% dos clubes sociais da cidade cerraram suas portas. Não há desfiles de rua. As escolas de samba e blocos da minha infância estão silentes. Meus pais e a maioria dos carnavalescos antigos morreram. E para completar o quadro funéreo, o telhado do Caixeiral da minha adolescência desabou.

 O que mais o destino reserva para esta Santa Maria tão machucada?

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